quinta-feira, 22 de abril de 2010

DO FUNDO DO BAÚ 3

Oi pessoal,

Revirando meus arquivos antigos encontrei o texto apresentado a seguir. Ele foi escrito em outubro de 2007, se não me engano, quando alguns membros da família Pinochet foram presos com base no processo sobre o esquema de desvio de verba pública que teria originado a fortuna do falecido general.

Eu estava pensando no Brasil, no Rio de Janeiro, na UFF e em todas as eleições que ocorrerão esse ano. Não sei por que esse texto me chamou a atenção e voltou à minha cabeça. Como quase sempre, sigo o impulso e coloco o assunto na frente de outros que provavelmente seriam mais atuais e interessantes para um eventual leitor. Aí vai:

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PINOCHET (texto de outubro de 2007)

Colegas,

Talvez esse assunto esteja longe dos temas de discussão prioritários de quase todos vocês, mas creio ser importante refletirmos um pouco sobre ele.

Na última quinta feira, dia 4 de outubro, li nos jornais que diversos membros da família Pinochet haviam sido presos com base no processo sobre o esquema de desvio de verba pública que teria originado a fortuna do falecido general – cerca de 27 milhões de dólares mantidos comprovadamente em contas no exterior.

Não alivia toda a dor e sofrimento causados pela ditadura chilena, mas, confesso, fiquei contente. Provavelmente todos serão soltos hoje e continuarão na sua linha de defesa na qual dizem que o dinheiro hoje no exterior não é fruto de corrupção – e sim de “doações, economias e rendimentos”.

Inacreditável América Latina, que já exorcizou os fantasmas das ditaduras militares e da tortura como instrumento de estado, mas na qual foram necessários quase 40 anos após o golpe militar de 1973 no Chile para que se pudesse falar publicamente: Augusto Pinochet. Ditador, assassino – e CORRUPTO.

Saudações acadêmicas

Heraldo.

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Como nos letreiros daqueles filmes que, ao final, explicam o destino dos personagens, informo que:

- Os membros da família Pinochet ficaram presos menos de 24 horas, creio.
- O Promotor do caso sofreu severas perseguições após essa prisão temporária dos Pinochet.

Contudo, ainda acredito que a America Latina conseguirá tratar a questão da corrupção endêmica na vida publica como tratou, e vem tratando, a questão das ditaduras militares e do uso da tortura como instrumento de estado.

Corrupção não pode ser tratada como coisa “natural” na política e na vida. No entanto, apesar de muitos repudiarem os políticos (e, como conseqüência, a política), principalmente pelas suspeitas de que uma boa parte deles não teria compromisso com a Ética Pública, eles votam em boa parte exatamente nesses corruptos. Ignoram solenemente dinheiro acumulado de forma suspeita fingindo pragmaticamente acreditar na explicação de que ele seria fruto “doações, economias e rendimentos”.

Numa América Latina onde as grandes fraudes eleitorais e manipulações de massas praticamente se acabaram, isso nos leva a refletir. O que explicaria esse movimento esquizofrênico de repudiar veementemente a corrupção e a falta de ética, mas votar e eleger um grande número de políticos sabidamente incompetentes, corruptos e pouco comprometidos com a democracia, ou, no mínimo, com um passado para lá de duvidoso?

Todos clamam por mudança na política, mas há os que esperam que essas mudanças venham “dos outros”, porque a lama toda em sua volta não seria absolutamente responsabilidade sua - cidadão honesto que só conhece gente bacana. Comportam-se de forma extraordinariamente semelhante a alguns prefeitos que alegaram jamais poder ser responsabilizados pelos recentes deslizamentos de terra causados pelas chuvas, pois a lama seria culpa de “outros” – de seus antecessores, de auxiliares e cientistas que não o alertaram, e de São Pedro, naturalmente.

As verdadeiras mudanças sociais quase sempre coincidem com mudanças de mentalidades e, conseqüentemente, do comportamento de cada indivíduo. Jogar a culpa da corrupção e falta de ética na política “nos outros” é fácil. Esperar que as soluções venham “dos outros” também é fácil. Eximir-se de responsabilidades é mais fácil ainda. Difícil é sair da pasmaceira e da acomodação convenientes, e correr riscos. Trombar com alguns supostos “poderosos”. Viver é correr riscos. Eventualmente tudo pode “continuar como está”. Eventualmente, tudo pode mudar, de repente, quase sempre aos saltos.

E se algum cidadão vota num corrupto supostamente por falta de alternativas para assegurar a execução de obras públicas relevantes, ou porque suas perdas (do ponto de vista material, profissional, etc.) seriam muito grandes com a queda desse dirigente político, é bom refletir. Provavelmente já se tornou também, conscientemente ou não, um corrupto.

Se as críticas à incompetência, à corrupção e ao descalabro ético na política feitas pela maioria das pessoas forem sinceras, basta excluir, no voto, em todas as instâncias possíveis, os indivíduos que são a óbvia negação de todas as nossas expectativas de uma sociedade menos injusta e desequilibrada.

Saudações Acadêmicas,
Heraldo

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