segunda-feira, 31 de maio de 2010

OS VIVOS E OS MORTOS

Franco Vive!

Foi o que muitos falaram quando o juiz Baltasar Garzon foi suspenso de suas funções depois ter sido indiciado por "investigação indevida" de crimes anistiados – clara vingança por ele ter, entre outras coisas, buscado reabrir processos sobre crimes contra a humanidade cometidos pela ditadura do Generalíssimo Francisco Franco, "Caudillo de España por la gracia de Dios" .

Apesar de entender e compartilhar da indignação dessas pessoas, me permito discordar – o problema não é o fantasma do Generalíssimo, mas os vivos, as "viúvas" do Franquismo e todos os omissos, que geralmente se calam e não querem se envolver com nada (mas que sempre aderem ao vencedor do momento).

Em novembro do ano passado postei o texto intitulado O SENADO BRASILEIRO E O ANJO DE LORCA, iniciado com o seguinte parágrafo: "Nos últimos tempos, não sei por que, tenho lido muito sobre a ditadura de Franco na Espanha. Misteriosa Espanha. Em sua história conviveram as mais elevadas e vanguardistas manifestações culturais junto com o mais bárbaro e absoluto obscurantismo". Premonitório.

Tal qual um filme B de Hollywood, os mortos-vivos do franquismo levantam de suas tumbas para saciar sua sede de sangue. Os mortos-vivos da política me preocupam, seja lá na Espanha ou aqui no Brasil. Ficam enterrados um tempão, calados e imóveis, mas mostram que ainda estão ativos quando pensam que suas vítimas estão frágeis e/ou distraídas. Sempre querendo acabar com as idéias novas, comendo os miolos dos seus desafetos.

Talvez os passivos e omissos sejam os mortos-vivos que mais me irritem. Não querem saber de marola. Sempre considerando qualquer novidade um prenúncio de confusão que perturbará sua paz de cemitério. Sempre lavando as mãos e se eximindo de qualquer responsabilidade nos atos dos mortos-vivos ativos, mas, também, sempre encontrando uma justificativa moral para aderir aos seus parceiros caso eles sejam vencedores (para, posteriormente, na derrota, fazer um "mea culpa" meio torto e dizer – Foram as circunstâncias! Eu não tive nenhuma responsabilidade nisso! Não sou e nunca fui igual a eles!).

Declaro aberta a temporada de caça aos mortos-vivos. Caça ecológica, serão todos colocados numa reserva para animais selvagens. Vou me especializar nos mortos-vivos passivos e omissos. Aqueles com cara de cera, bonzinhos e cordiais como uma serpente. Do além, Mario de Andrade me sopra seus versos:

Eu insulto o morto-vivo
Aquele que sendo francês, brasileiro, italiano,
é sempre um cauteloso pouco-a-pouco!

Come! Come-te a ti mesmo, oh! gelatina pasma!
Oh! purée de batatas morais!
Ódio aos temperamentos regulares!
Ódio aos sem desfalecimentos nem arrependimentos,
sempiternamente as mesmices convencionais!

Morte às adiposidades cerebrais!
Ódio vermelho! Ódio fecundo! Ódio cíclico!
Ódio fundamento, sem perdão!
Fora! Fu! Fora morto-vivo!...

Saudações acadêmicas
Heraldo

quinta-feira, 13 de maio de 2010

UM

CHAPA UM - PALHARINI E BRUNO. Como já é tradição, torno público o meu voto na consulta eleitoral para reitor e vice-reitor na UFF. Imagino que minha opção já estivesse clara para os que tiveram paciência de ler as minhas mensagens. Contudo, acreditem, meu posicionamento foi fruto de um processo bastante intenso e demorado de reflexão. Sem nenhuma ingenuidade e sem buscar nutrir falsas expectativas de mudanças extraordinárias, creio que é a chapa com maior disposição para quebrar velhos paradigmas na busca de um sistema de gestão mais moderno, eficiente e transparente. Sistema criado pela necessidade e não pelo fato dos envolvidos serem seres humanos melhores ou mais iluminados.

Já escrevi antes que a universidade praticamente avança em modo automático, graças aos seus grupos de pesquisadores, programas, departamentos, etc. Basta o reitor não atrapalhar muito. Recentemente divulguei o texto MINIMUM MINIMORUM, apresentando o que para mim seria o piso mínimo para apoiar algum candidato: (i) UMA POLÍTICA ORÇAMENTÁRIA DEMOCRÁTICA; (ii) UMA POLÍTICA TRANSPARENTE PARA ALOCAÇÃO DE VAGAS E CONTRATAÇÕES; (iii) CONSULTAS DIRETAS PARA DIREÇÕES EM TODOS OS NÍVEIS COM O FIM DAS NOMEAÇÕES "PRO TEMPORE" QUE SE TORNARAM PERMANENTES E (IV) A INDISSOCIABILIDADE DA BUSCA DA QUALIDADE COM A DEMOCRACIA UNIVERSITÁRIA. A chapa dois, a meu ver, pela gestão atual e pelo que promete no futuro, não atende e nem vai atender a essas condições mínimas apresentadas.

Na última eleição para reitor na UFF, em 2006, escrevi o texto UNIVERSIDADE PARTIDA, no qual informava:

"Há quatro anos atrás não apoiei a reeleição do professor Cícero Mauro Fialho Rodrigues. Sem absolutamente nenhuma crítica relevante de cunho pessoal a ele e ao seu vice, professor Antonio José dos Santos Peçanha. Minha posição era justificada por duas questões básicas de princípio:

1) Ser contrário à possibilidade de reeleição para reitores de universidades;

2) A necessidade de romper na UFF uma tradição pouco democrática de compartilhamento do poder (tradição, aliás, verificada num número expressivo de IFES).

Apesar de a UFF estar passando por um processo de afirmação e modernização que é irreversível, este processo poderia (e ainda pode) ser mais rápido ou mais lento, dependendo das circunstâncias. "

Nessa eleição, mantenho a mesma posição manifestada publicamente nos últimos oito anos - continuo contrário a possibilidade de reeleição para reitores e vendo a necessidade de ampliar a transparência e a democracia universitárias. Contudo, no caso atual, tenho também críticas relevantes à administração que busca a sua continuidade através da chapa 2, com a reeleição do reitor.

O candidato a reitor pela chapa 2 teve chance de mostrar ao que veio na atual gestão. Falhou. Do ponto de vista da Administração Central, erros imperdoáveis foram e estão sendo cometidos. Errou na definição de prioridades; equivocou-se na gestão; adotou uma política orçamentária opaca; aumentou a burocracia interna; exorbitou na nomeação "pro tempore" de diretores de pólos e de unidades isoladas no interior; tratou desnecessariamente adversários políticos como inimigos. Na sua gestão houve um retrocesso nos critérios de alocação de vagas e contratações e, também, foram sistematicamente afrouxados critérios de qualidade já consolidados no CEP (exigência de titulação, priorizar contratações em regime de DE, etc.). Salvou-se pelo gongo com o Reuni, apesar de ter feito muito pouco com os mais de 120 milhões de reais transferidos para a UFF e ao seu dispor. Agora informa de que tudo o que não foi feito será realizado, desde que o reelejam.

Ele e seus estrategistas cometeram erros políticos imperdoáveis. Foram desastrosas as intervenções em Volta Redonda e em Friburgo. Também desastroso foi, mesmo tendo maioria no CUV, deixar passar de forma enviesada um plebiscito sobre os cursos pagos com a pergunta mais maniqueísta possível - é sim ou é não - quase na mesma época da consulta para reitor. Com o plebiscito, induziram a mobilização dos grupos e partidos favoráveis à total proibição dessas atividades. Para mim deram a impressão de querer intencionalmente amedrontar a todos os de alguma forma ligados a esses cursos pagos, para posteriormente se apresentar como a última esperança sobre a face da terra - os "salvadores dos empreendedores". Ganhar votos aos borbotões. Aparentemente, acreditam ter o poder de deixar iniciar um processo dessa magnitude, controlá-lo e posteriormente suspendê-lo após tirar disso o maior proveito eleitoral possível. Pura ilusão. Seja essa minha impressão verdadeira ou não, como resultado, assim como no caso da intervenção nos pólos, teremos mais uma crise institucional, previsível e anunciada.

Um fato notável é que a chapa dois vem conseguindo realizar uma proeza: reunir alguns dos melhores quadros da UFF (professores e funcionários), em minoria, com o que de mais atrasado pode haver do ponto de vista acadêmico numa universidade pública. Soma cuja resultante política é menor do que zero, é claro. Minoria que acredita, apesar da experiência dos últimos três anos, que cada pró-reitoria acadêmica (PROPP, PROAC, PROEX) possa ter vida própria independente de todo o sistema universitário. Na prática, a universidade é dividida em partes, como um salame, com fatias distribuídas para os subgrupos de poder que se desprezam dois a dois e que vivem na ilusão de não ser contaminados pelas ações uns dos outros. A única condição é não ver, não ouvir e não falar nada que esteja relacionado com o que os outros estão fazendo com suas fatias do salame.

Alguns dos que, por algum motivo, aparentemente já manifestaram o seu voto pela chapa 2 são pessoas com as quais me relaciono bem do ponto de vista pessoal e que considero meus pares. Dirijo-me especialmente a cada um desses colegas: Pense um pouco mais nas possíveis conseqüências do seu voto. Quem sabe, no escurinho da urna as idéias clareiem, o coração bata mais forte, a mão trema e, num impulso, você crave na cédula: UM.

Conclamo todos a participar conscientemente dessa consulta eleitoral. Apesar de falhas no sistema, ainda não inventaram nada melhor do que a consulta direta para aferir os desejos de uma comunidade. Mas lembrem-se: na política, diferente do que acontece na matemática, UM pode ser muito mais do que dois. Peço aos colegas ainda em dúvida em relação ao seu voto que reflitam sobre isso.

Saudações acadêmicas
Heraldo

sexta-feira, 7 de maio de 2010

JUBILEU

“But I, being poor, have only my dreams;
I have spread my dreams under your feet;
Tread softly because you tread on my dreams”

Aedh wishes for the Cloths of Heaven
The Wind Among the Reeds. 1899.
W.B. Yeats (1865–1939).


Oi Pessoal,

Já recebi respostas para algumas das perguntas formuladas no texto PERGUNTAR NÃO OFENDE III. O concurso continua valendo. O vencedor ganhará um bilhete Niterói-Rio-Niterói (barcas). Já tenho dois fortes concorrentes que procuraram responder de forma pública e impessoal a algumas das perguntas: (i) a PROAC, buscando explicar o projeto FEC de R$ 5.756.996,00 (cinco milhões, setecentos e cinqüenta e seis mil novecentos e noventa e seis reais) para “apoio e gerenciamento à organização e realização das atividades inerentes ao Projeto - A Gestão Gerencial (sic) no Processo de Desenvolvimento da PROAC/UFF” e (ii) a respeitadíssima professora Ismênia de Lima Martins, que foi levada a tentar publicamente justificar através de e-mail os R$ 903.200,00 (novecentos e três mil e duzentos reais) alocados para o Jubileu de Ouro da UFF no projeto FEC “apoio e gerenciamento do Jubileu de Ouro da UFF” usando o argumento de que “O orçamento em questão previu, em média, menos de 3 mil reais mensais por unidade departamental”.

Nesse caso, não resisto e faço mais duas perguntas:

A divisão dos R$ 903.200,00 (novecentos e três mil e duzentos reais) por R$ 3.000 dá, aproximadamente, trezentos e um Departamentos. Contudo, na página oficial da UFF são mencionados menos de setenta cursos. Certamente, mesmo com a expansão feita no âmbito do REUNI, não temos nem 100 Departamentos de Ensino na UFF. Portanto, a conta não bate. Seriam mais de R$ 10.000,00 (dez mil reais) por Departamento. Ou a divisão feita pelos assessores da professora está errada, ou há Departamentos de Ensino não mencionados nas estatísticas oficiais da UFF. QUANTOS DEPARTAMENTOS DE ENSINO TEM A UFF?

Os R$ 903.200,00 (novecentos e três mil e duzentos reais) correspondem a uma vez e meia o definido no PDI para as bibliotecas nesse ano do Jubileu. Não é pouco. Não faço nenhum juízo moral e jamais levantei qualquer suspeita de desvios ou qualquer coisa semelhante. Contudo, questiono seriamente o valor alocado para as comemorações do Jubileu de Ouro. Valor que pode ser até pequeno para alguns diante da importância simbólica da comemoração, mas que é enorme para uma universidade ainda com muito mais necessidades do que recursos.

Tenho certeza de que a Comissão de Orçamento do PDI teria alocado um valor maior para as bibliotecas caso tivesse conhecimento dessa folga orçamentária. Pelo menos, alguma discussão coletiva deveria ter ocorrido no CUV para a definição de prioridades e valores. Mesmo que o valor previsto para a comemoração do Jubileu correspondesse a apenas 3 mil reais por Departamento, PORQUE NO ANO DO JUBILEU DE OURO NÃO SE DISTRIBUI TAMBÉM 3 MIL REAIS PARA CADA DEPARTAMENTO COMPRAR MATERIAL DE CONSUMO – MARCADORES PARA QUADROS BRANCOS, PAPEL, CARTUCHOS E TONNER PARA IMPRESSORAS, POR EXEMPLO?

Isso faria a comemoração do ano do cinqüentenário ainda mais sensacional.


A DANÇA DAS CANETAS

O atual momento político na UFF, incluindo aí a consulta para reitor, é peculiar. Há um evidente marasmo naquelas atividades políticas mais tradicionais – panfletagem, cartazes, passagens em turma, etc., etc. – mas, em compensação, tem havido um ativo e rico debate através da internet, com muitas trocas de mensagens e de textos com as mais plurais manifestações de idéias e propostas - com reflexões, manifestos e, certamente, com provocações e respostas.

Num recente debate, o atual reitor manifestou publicamente, me pareceu, certo desconforto em relação a mim e os meus textos divulgados através do blog, que também são enviados por e-mail para algumas pessoas selecionadas. Citou-me nominalmente após eu ter feito, por escrito e me identificando, conforme as regras da Comissão Eleitoral, a inofensiva pergunta sobre qual seria a posição das chapas em relação à criação de uma Ouvidoria na UFF. Comentou que eu teria promovido “uma caça as bruxas” quando ocupei a função de Presidente da Comissão de Ética Pública da UFF. Não entendi nada, e ele não explicou quais as “bruxas” eu buscava caçar, já que as decisões das Comissões de Ética não têm força de lei.

Raramente fiquei tão constrangido como nesta situação, na qual estava impedido de me manifestar. O desconforto do reitor é surpreendente e desnecessário, até porque os últimos textos (PERGUNTAR NÃO OFENDE III, PINOCHET e MICARETA) não tinham ligação com ele. Associou-se aos textos porque quis e chateou-se não sei por qual razão.

Na prática, o único fato é que nesse preciso momento estamos travando uma dança, uma metafórica dança das canetas. De um lado a caneta cheia de tinta do Dirigente que nomeia, premia e destitui. Prerrogativa de todos os dirigentes, é fato. De outro, eu com a minha a caneta expressando eventualmente, mas publicamente, alguma idéia e/ou opinião, fruto de processo pessoal ou coletivo de reflexão. Não há conflito “stricto sensu”, mas há embate político e filosófico. Embate respeitoso da minha parte, embora recheado com alguma ironia.

Imagino ser um camarada bastante inofensivo, que está apenas seguindo uma das mais antigas tradições acadêmicas – a redação e divulgação de textos com opiniões. Tradição epistolar modernizada pela internet, mas sempre tradição. Devo parecer ainda mais inofensivo para aquelas pessoas que acreditam na força da grana e no poder como os motores da História. De meu lado tenho apenas a força das minhas idéias, alguma capacidade de convencimento e a coerência nas minhas convicções, nada mais.

Saudações Universitárias
Heraldo