terça-feira, 16 de agosto de 2011

ROAD TO NOWHERE

We´re on the road to nowhere, come on inside
We´ll take that ride to nowhere, we´ll take this ride..

Road to nowhere. Talking Heads, 1985



Oi pessoal,

Após quase um ano em silêncio, retomo a nossa prosa. Talvez mais por vício do que por necessidade. Por diversão, só me dou 30 minutos para escrever o que me passa pela cabeça. Muitos me perguntam o motivo de eventualmente adotar um estilo hermético e metafórico em algumas das minhas mensagens, parecendo um daqueles filmes antigos do Carlos Saura - difíceis de entender devido a uma linguagem muito cifrada. Eu explico - assim como o famoso diretor espanhol, sei que em rio que tem piranha, jacaré nada de costas. Meus motivos são parecidos com os dele, é claro.

Imagino ser um camarada bastante inofensivo, que está apenas seguindo uma das mais antigas tradições acadêmicas - a redação e divulgação de textos com opiniões. Tradição epistolar modernizada pela internet, mas sempre tradição. Devo parecer ainda mais inofensivo para aquelas pessoas que acreditam na força da grana e no poder como os motores da História. De meu lado tenho apenas a força das minhas idéias, alguma capacidade de convencimento e a coerência nas minhas convicções, nada mais.

I - SOBRE O REUNI

Para quem não sabe, fui e continuarei sendo um ferrenho crítico do REUNI seja pela forma voluntarista como foi concebido, seja pela equivocada proposta acadêmica que o originou (a ''universidade nova'' - mesmo que tenha sido abandonada posteriormente).

Apesar disso, acho que fui uma das pessoas que contribuíram e lutaram pela aprovação de um projeto institucional da UFF dentro desse programa, por uma razão bem simples: recursos públicos são públicos. Não aceitaria jamais ficar excluído de qualquer programa federal que pudesse trazer recursos públicos para a UFF. Evidentemente, também jamais cairia na ''casca de banana'' da adesão voluntária a um programa opaco, pouco eficiente e eleitoreiro. Sempre acreditei que, se fosse para fazer algum tipo de desobediência, o melhor seria aceitar os recursos do REUNI e ignorar solenemente algumas metas voluntaristas impostas artificialmente - difíceis ou impossíveis de cumprir e que ignoram completamente especificidades locais e a questão da qualidade acadêmica.

Conforme mencionei num texto de 2009: ''Dificilmente essas verbas do REUNI serão cortadas até 2010, ano eleitoral, independentemente do cumprimento das metas. O que me preocupa é: (i) a gestão coletiva democrática desses recursos; (ii) a falta de capacidade de executar com competência projetos academicamente adequados em tão reduzido prazo de tempo, (ii) o 'pós 2010', quando, certamente, teremos cortes, dependendo da melhor ou pior capacidade de gestão e de execução de cada IFES; (iv) finalmente, também me preocupa se a verba de custeio das universidades aumentará proporcionalmente ao aumento de gastos devido à expansão (energia, água, segurança, limpeza, etc.). ''

Mantenho hoje tudo que escrevi há quase três anos atrás de forma quase premonitória.

II - OS PROJETOS VIA ORLA E VIA 100 DA PREFEITURA MUNICIPAL DE NITERÓI

Na realidade, o que me motivou a encaminhar esse novo texto foi a notícia de que a UFF seria obrigada a ceder quase 100 mil metros quadrados de seu terreno para os projetos VIA ORLA e VIA 100 da Prefeitura Municipal de Niterói (PMN). Pior - essas construções seriam iniciadas imediatamente, a partir dessa semana. O argumento básico para essa exigência seria o potencial transtorno ao bom trânsito da cidade de Niterói causado pelo programa de expansão da UFF.

É fundamental observar que não há menção sobre os projetos VIA ORLA, VIA 100 e a conseqüente cessão de terrenos da UFF para a execução dos mesmos em NENHUM documento oficial da universidade, como, por exemplo, o Plano de Desenvolvimento Institucional da UFF (PDI) 2008-2012 submetido à reunião ordinária do CUV em 29/04/2004, O novo Plano diretor da UFF aprovado pelo CUV, e nem no documento ''Adequação do uso do solo dos Campi da Universidade Federal Fluminense'' (CUV de jun/2008, ver a figura do novo Plano Diretor, abaixo). Também não há menção alguma sobre essas vias no projeto de expansão da UFF encaminhado ao MEC dentro do REUNI e nem nas prestações de contas ordinárias anuais - relatórios de gestão dos exercícios de 2008, 2009 e 2010.

Portanto, ceder esses terrenos claramente nunca fez parte de nenhum planejamento ou projeto da UFF.

A expansão da UFF, no seu pico, acrescentará (esperamos) até 15 mil alunos novos à universidade, distribuídos nos mais de 16 municípios do Estado nos quais a UFF tem atividade. A maior parte desses novos alunos vai para os pólos do interior (Rio das Ostras e Volta Redonda). Certamente é duvidoso o argumento de esse aumento no número de alunos causaria impacto significativo no trânsito da cidade.

Curiosamente, ao contrário do projeto de expansão da UFF, a PMN não criou tantas dificuldades para liberar a construção do CONDOMÍNIO GRAGOATÁ BAY, na Av. Almirante Tamarindo (no caminho ligando o Gragoatá à Praia Vermelha). Esse projeto certamente perturbará muito mais o trânsito e a comunidade de Niterói do que a expansão da UFF e é claramente inviável sem a VIA 100 e a VIA ORLA. O interessante é que a PMN gostaria de permitir o tráfego de caminhões na VIA ORLA, que passaria colada aos prédios da UFF. Contudo, na VIA 100, que passaria ao lado do CONDOMÍNIO GRAGOATÁ BAY, o tráfego seria restrito apenas aos automóveis.

Os projetos VIA ORLA e VIA 100 (ver o mapa acima): (i) são criticados por quase todos os urbanistas e especialistas em mobilidade urbana e ligam o nada a lugar nenhum; (ii) Na minha opinião inviabilizariam a atual localização da Creche da UFF (sendo que o seu local definitivo, previsto no antigo Plano Diretor para a Praia Vermelha, também foi eliminado do atual Plano Diretor da UFF); iii) Criariam sérios problemas de segurança para a universidade; iv) Afetariam a comunidade localizada há anos no Gragoatá, provavelmente causando a remoção de mais de 100 famílias; v) Criariam um gargalo no trânsito próximo do MAC, só transferindo o problema para alguns metros adiante.

III - PERGUNTAR NÃO OFENDE


Perguntas impertinentes podem desafinar o coro dos contentes, mas não significam nada sem as respostas adequadas.

Como não tenho paciência para participar de debates e audiências, apresento a seguir, um conjunto de perguntas para as quais desconheço as respostas.

Continua valendo a promoção que começou com o início dessa série: quem me der as melhores respostas ganhará, como prêmio, um bilhete de ida e volta Rio - Niterói (barcas). No caminho, o vencedor (ou vencedora) poderá refletir sobre os mistérios da vida, aproveitando uma das vistas mais deslumbrantes do mundo, que na correria do dia-a-dia deixamos de perceber.

A impertinência, caso exista, estará na sua resposta, cidadão. Ou não.

1) PORQUE CABERIA À UFF RESOLVER UM PROBLEMA BASICAMENTE CRIADO PELA EXPANSÃO IMOBILIÁRIA EM NITERÓI CEDENDO TERRENO PÚBLICO FEDERAL PARA OBRAS DE ''ADEQUAÇÃO'' VIÁRIA?

2) NO PROJETO VIA ORLA APARENTEMENTE TAMBÉM ESTÁ PREVISTO O USO DE TERRENOS DA UFF NA AVENIDA LITORÂNEA, EM FRENTE AO CAMPUS DA PRAIA VERMELHA. PORQUE NENHUM MAPA APRESENTADO PELA UFF SOBRE O PROJETO MOSTRA ISSO?

3) A UFF ESTARIA SENDO PRESSIONADA DE ALGUMA FORMA A CEDER ESSES TERRENOS? POR QUEM? QUEM GANHARIA COM ISSO?

4) FUI INFORMADO NA SECRETARIA DOS CONSELHOS DA UFF QUE O CONSELHO UNIVERSITÁRIO (CUV) AINDA NÃO DELIBEROU FORMALMENTE NADA EM RELAÇÃO A ESSA CESSÃO DO TERRENO DA UFF, COM A CONSEQÜENTE MUDANÇA DO PLANO DIRETOR DA UFF. CASO A CESSÃO JÁ SEJA UM FATO CONSUMADO, COMO INFORMAM OS JORNAIS E A PÁGINA DA UFF NA INTERNET, COMO SE DEU ESSE PROCESSO? O CUV DEVE OU NÃO DEVE APROVAR A DECISÃO TOMADA APARENTEMENTE ''AD REFERENDUM'' PELA ADMINISTRAÇÃO CENTRAL DA UFF?

5) MESMO QUE A COMUNIDADE UNIVERSITÁRIA MAJORITARIAMENTE CONCORDE COM ESSES PROJETOS (PESSOALMENTE EU DUVIDO MUITO DISSO), QUAIS SERIAM AS CONTRAPARTIDAS OFERECIDAS PELA PMN - CLARAS E NUM DOCUMENTO OFICIAL?

6) SE A CONSTRUÇÃO DA VIA ORLA JÁ FOR UM FATO CONSUMADO, PORQUE NÃO EXIGIR COMO UMA DAS CONTRAPARTIDAS UM POSICIONAMENTO CLARO DA PMN EM RELAÇÃO À POSSE PELA UFF DO PLATÔ ENTRE A GRAGOATÁ E A PRAIA VERMELHA (VER O MAPA ANEXO), EM LITÍGIO HÁ DÉCADAS E DISPUTADO PELA INDÚSTRIA DA EXPANSÃO IMOBILIÁRIA?


IV - CAROS AMIGOS

Apesar de eu não ter concordado com algumas decisões feitas na alteração do Plano Diretor da UFF (como eliminar a Creche da UFF e a Biblioteca Central da Praia Vermelha do novo Plano Diretor), apoio integralmente todas as ações da UFF no REUNI que tenham sido democraticamente discutidas e aprovadas por maioria nas instâncias superiores da universidade. Reafirmo, no entanto, que em nenhuma discussão sobre a recente alteração do Plano Diretor da UFF sequer foi mencionada a cessão de terrenos da universidade como condição necessária para a viabilidade do projeto de expansão da UFF em Niterói.

A impressão que eu tenho é que as obras de expansão da UFF não têm nenhuma ligação direta com os projetos VIA ORLA e a VIA 100 mas que essas obras foram o pretexto perfeito para justificar a construção dessas vias ocupando terrenos públicos federais da UFF. O processo de discussão sobre esse assunto foi muito falho, podendo dar a impressão de que essa decisão já havia sido tomada há muito tempo, com apoio de setores da própria universidade. Essa (falsa?) impressão fica ainda mais forte por causa da inexplicável construção de um muro separando uma faixa de terreno da UFF na avenida litorânea. Construção iniciada há bastante tempo (ver a foto em anexo, tirada há quase dois anos). Muro de certa maneira ''escondido'' atrás da cerca de arame farpado que delimita a área original do campus da Praia Vermelha. Por pura coincidência, a construção foi interrompida quando membros da Comunidade Acadêmica exigiram publicamente uma explicação para aquilo e tanto o TCU e a CGU iniciaram um processo de análise da obra do Instituto de Computação, situado no Campus da Praia Vermelha. Agora, creio, com essa notícia publicada nos jornais, o muro vai ''sair do armário''.

Embora seja bastante improvável, eu gostaria muito de que o CUV ignorasse as exigências descabidas feitas pela PMN em relação ao nosso projeto de expansão. Não cabe à UFF resolver problemas de mobilidade urbana que não foram e nem serão absolutamente causados pelo seu projeto de expansão. Problemas de mobilidade claramente muito mais relacionados com a expansão imobiliária descontrolada na cidade de Niterói.

Sonho com esse posicionamento coerente, firme e democrático do CUV. Confio sinceramente na capacidade de todos os conselheiros e acredito na sua seriedade. Apesar disso, nos últimos dias não tenho conseguido evitar um pesadelo recorrente sobre esse assunto (pesadelo de verdade, durante o sono, sem brincadeira): o egrégio Conselho Universitário da UFF resolve por maioria homologar esse acordo com a PMN e, num sinal de unidade, a decisão é aplaudida - de joelhos - por toda a plenária..

Saudações Universitárias
Heraldo
http://www.heraldo-emlinhareta.blogspot.com/