terça-feira, 27 de abril de 2010

PERGUNTAR NÃO OFENDE III

“Que grande vantagem trazer a alma virada do avesso!
Ao menos escrevem-se versos.
Escrevem-se versos, passa-se por doido, e depois por gênio, se calhar,
Se calhar, ou até sem calhar,
Maravilha das celebridades!”

Acaso (Fernando Pessoa)


Alô Pessoal,

Embora possa parecer repetido para alguns, esse texto trata de assuntos novos. Algumas repetições são necessárias, pois novos leitores estão se incorporando a nossa saudável corrente de discussão. Certamente não tiveram tempo para acompanhar tudo o que já foi postado e pegar o fio da meada. Para os sem paciência, sugiro pular direto para as perguntas. Vale a pena, pois esse é o último texto da série PERGUNTAR NÃO OFENDE.

Perguntas impertinentes podem desafinar o coro dos contentes, mas não significam nada sem as respostas adequadas.

Como não tenho paciência para participar de debates e audiências, apresento a seguir, um conjunto de perguntas para as quais desconheço as respostas.

Continua valendo a promoção: quem me der as melhores respostas ganhará, como prêmio, um bilhete de ida e volta Rio - Niterói (barcas). No caminho, o vencedor (ou vencedora) poderá refletir sobre os mistérios da vida, aproveitando uma das vistas mais deslumbrantes do mundo, que na correria do dia-a-dia deixamos de perceber.

A impertinência, caso exista, estará na sua resposta, cidadão. Ou não.


1) Há diversos pólos e unidades isoladas com direções nomeadas ad referendum, boa parte, contrariando a legislação federal. QUANDO HAVERÁ CONSULTA ELEITORAL PARA AS DIREÇÕES DOS PÓLOS (E TAMBÉM PARA AS UNIDADES ISOLADAS)?

2) A UFF, aparentemente, cedeu para a Prefeitura de Niterói alguns milhares de metros quadrados na beira da Baía da Guanabara, no campus da Praia Vermelha. É uma faixa de terra comprida, que permitirá a duplicação da Avenida Litorânea. O muro separando essa faixa de terreno da UFF já estava em fase adiantada de construção, meio escondido atrás da cerca de arame farpado que delimita a área original do campus, quando a obra foi aparentemente interrompida. Ceder um terreno público federal para um poder municipal é tarefa difícil. COMO FOI O PROCESSO DE CONSULTA À COMUNIDADE E AOS ESPECIALISTAS EM URBANISMO? O QUE A UFF GANHOU EM TROCA? QUANDO FOI APROVADA PELO CONSELHO UNIVERSITÁRIO A CESSÃO DO TERRENO COM A CONSEQÜENTE MUDANÇA DO PLANO DIRETOR DA UFF? A OBRA PAROU OU NÃO PAROU? PAROU POR QUÊ?

3) No Plano de Desenvolvimento institucional da UFF estabeleceu-se a meta de, no máximo, 5% das vagas de concurso para as classes de Assistente e Auxiliar (o resto deveria ser para a classe de Adjunto). Estabeleceu-se, também, um limite para a contratação de professores no regime de 20 horas semanais. QUAL A PERCENTAGEM DE CONCURSOS REALIZADOS NA UFF PARA AS CLASSES DE ASSISTENTE E AUXILIAR NOS ÚLTIMOS 3 ANOS? QUAL FOI A LEGISLAÇÃO DA UFF, APOIADA PELA PROAC, QUE PERMITIU TRANSFORMAR A PONTUAÇÃO DOS PROFESSORES SUBSTITUTOS NO BANCO DE DOCENTES DA UFF EM CONTRATAÇÕES EFETIVAS? QUANTOS PROFESSORES NO REGIME DE 20 HORAS FORAM CONTRATADOS NOS ÚLTIMOS ANOS DENTRO DESSE PROCESSO?

4) Há mais de dois anos foi criada no CEP uma comissão para rever e reformar o Regulamento dos Programas e Cursos de Pós-Graduação Lato Sensu da Universidade Federal Fluminense. Essa Comissão elaborou um anteprojeto que previa uma aumento no grau de controle acadêmico, mas reduzindo os trâmites burocráticos para criação e renovação de cursos meritórios. ONDE ESTÁ ESSE ANTEPROJETO? QUANDO ELE SERÁ SUBMETIDO À DISCUSSÃO PUBLICA E SUBMETIDO À PLENÁRIA DO CEP?

5) Burocracia é um dos instrumentos mais eficientes para o exercício do autoritarismo. Os excessos burocráticos intimidam e permitem um “controle” muito maior do que a brutalidade e violência. Na UFF os excessos burocráticos são evidentes, sejam eles involuntários ou não. Diretores de Unidade, Chefes de Departamento, Coordenadores de projetos de pesquisa, Coordenadores de cursos (pagos ou não) são obrigados a desafiar um cipoal de procedimentos injustificáveis e, quase sempre, incompreensíveis para ter qualquer iniciativa aprovada. O resultado é uma enorme insegurança quanto ao cumprimento de prazos e até mesmo quanto a legalidade do que está se fazendo. Beijar mãos e ceder apoios políticos é, para alguns, o caminho mais fácil para abrir caminhos e ter projetos aprovados. QUEM GANHA COM ESTES EXCESSOS BUROCRÁTICOS. COMO REDUZIR A BUROCRACIA NA UNIVERSIDADE?

6) Nem todas as atividades administrativas aparecem na página da UFF (nem todos Assessores e Coordenadores de pró-reitorias estão lá, por exemplo). Há alguns desses cargos ou funções que são pagos através da FEC (Fundação Euclides da Cunha). É fato sabido e notório que não é possível acumular gratificações de natureza administrativa, devendo-se optar pela mais alta. COMO PODERIA SER FEITO O CRUZAMENTO DE EVENTUAIS FUNÇÕES ADMINISTRATIVAS EXPLICITADAS NA FOLHA DE PAGAMENTO (COORDENADORIAS DE CURSOS E/OU DE PRÓ-REITORIAS, CHEFIAS, ETC) COM AS GRATIFICAÇÕES PAGAS ATRAVÉS DE BOLSA DA FEC?

7) O valor pago como contrapartida pelo espaço ocupado por agências bancárias dentro dos campi da UFF aumentou muito nos últimos 3 anos, fruto de uma muito acertada estratégia de negociação. QUAL É O PLANO DE APLICAÇÃO DESSE RECURSO? HÁ PRIORIDADES? ALGUMA COISA VEM SENDO TRANSFERIDA PARA O PLANO DE DESENVOLVIMENTO INSTITUCIONAL DA UFF (PDI)?

8) No DOU Nº 123 de 01/07/2009, na página 79 da Seção 3, consta que a FEC foi contratada para “apoio e gerenciamento à organização e realização das atividades inerentes ao Projeto - A Gestão Gerencial (Sic) no Processo de Desenvolvimento da PROAC/UFF - por R$ 5.756.996,00 (cinco milhões, setecentos e cinqüenta e seis mil novecentos e noventa e seis reais). Vigência: 30/12/2008 a 31/12/2009. O QUE FOI FEITO EXATAMENTE COM ESSE RECURSO? HOUVE PAGAMENTO DE BOLSAS? CASO A RESPOSTA SEJA AFIRMATIVA, HOUVE PAGAMENTO DE BOLSA PARA ALGUÉM QUE RECEBA GRATIFICAÇÃO POR CARGO DE DIREÇÃO (CD)?

9) No DOU Nº 238 de 14/12/2009, na página 64 DA Seção 3, consta que a FEC foi contratada para “apoio e gerenciamento do Jubileu de Ouro da UFF” por R$ 903.200,00 (novecentos e três mil e duzentos reais). Vigência: 11/12/2009 a 11/12/2010. O QUE ESTÁ SENDO FEITO EXATAMENTE COM ESSE RECURSO? HÁ PAGAMENTO DE BOLSAS? CASO A RESPOSTA SEJA AFIRMATIVA, HÁ, OU HOUVE, PAGAMENTO DE BOLSA PARA ALGUÉM QUE RECEBA GRATIFICAÇÃO POR CARGO DE DIREÇÃO (CD)?

10) No DOU Nº 178, de 17/09/2009, na página 58 da seção 3, consta que a FEC foi contratada para projeto destinado a “organização dos documentos relativos aos atos e fatos da gestão orçamentária e financeira da UFF” por R$ 982.983,95 (novecentos e oitenta e dois mil novecentos e oitenta e três reais e noventa e cinco centavos). Vigência: 01/10/2009 a 01/10/2010. O QUE ESTÁ SENDO FEITO EXATAMENTE COM ESSE RECURSO? HÁ PAGAMENTO DE BOLSAS? CASO A RESPOSTA SEJA AFIRMATIVA, HÁ, OU HOUVE, PAGAMENTO DE BOLSA PARA ALGUÉM QUE RECEBA GRATIFICAÇÃO POR CARGO DE DIREÇÃO (CD)?

11) No DOU Nº 145, de 31/07/2009, na página 88 da Seção 3, consta que a FEC foi contratada para “apoio e gerenciamento do projeto desenvolvimento das ações estratégicas e operacionais na execução do plano de expansão e reestruturação – PDI”, por R$ 755.118,00 (setecentos e cinqüenta e cinco mil cento e dezoito reais). Vigência: 29/07/2009 a 30/07/2010. O QUE ESTÁ SENDO FEITO EXATAMENTE COM ESSE RECURSO? HÁ PAGAMENTO DE BOLSAS? CASO A RESPOSTA SEJA AFIRMATIVA, HÁ, OU HOUVE, PAGAMENTO DE BOLSA PARA ALGUÉM QUE RECEBA GRATIFICAÇÃO POR CARGO DE DIREÇÃO (CD)?

12) No DOU Nº 206, de 28/10/2009, na página 89 da Seção 3, consta que uma assessora externa foi contratada pelo valor total de R$ 180.000,00 (cento e oitenta mil reais) para “prestação de Serviços de Assessoria em subsídio as equipes da UFF nas estratégias operacionais para a execução das ações estabelecidas no Plano de Expansão e Reestruturação e no Plano de Desenvolvimento Institucional da UFF”. Vigência: 17/09/2009 a 17/09/2010. Portanto, a Assessora do Reitor, que não faz parte dos quadros da UFF, está recebendo cerca de R$ 18.000,00 (dezoito mil reais) mensais para essa árdua tarefa. QUE TIPO DE SERVIÇO ESTA ASSESSORA ESTÁ FAZENDO EXATAMENTE? NÃO HÁ NENHUM PROFISSIONAL (OU EQUIPE DE PROFISSIONAIS) DA UFF, DA ÁREA DE GESTÃO E/OU DE ENGENHARIA, CAPAZ DE FAZER ESSE TIPO DE TRABALHO?

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Já comentei em outras mensagens sobre os anjos tortos - o de Drummond e o de Torquato – um aconselhando a ser “gauche na vida”, outro, “entre um sorriso de dentes, a desafinar o coro dos contentes''. Informei também que, como Drummond e Torquato, sempre tive a companhia de um anjo torto. Meu anjo torto não sorri como o anjo de Torquato - e não está para brincadeiras.
Numa noite, em 1991, acordei e pintei o seu rosto em menos de dois minutos. É o único dos meus quadros que eu deixo sobre a minha cabeceira. Foi o único, até hoje, que a minha filha não perguntou o que (ou quem) era, o que significava ou porque eu o tinha feito. Ele simplesmente estava lá e fazia companhia ao pai.

Meu anjo torto se comunica comigo e faz provocações. No limite, nunca sei se estou tendo alguma visão premonitória do futuro, fruto de sua proximidade comigo, ou se, simplesmente, analisei processos em andamento, intuí tendências e, correndo riscos, fiz previsões fingindo poder ler a mão do Destino, como no caso do recente texto “Águas de Março”.

Águas também correrão em maio, afirmo. Como em março, muita lama, novamente. Teremos novas surpresas e emoções. Nesse caso, mais comédia do que tragédia. Esperem e confiem.


Saudações acadêmicas
Heraldo



quinta-feira, 22 de abril de 2010

DO FUNDO DO BAÚ 3

Oi pessoal,

Revirando meus arquivos antigos encontrei o texto apresentado a seguir. Ele foi escrito em outubro de 2007, se não me engano, quando alguns membros da família Pinochet foram presos com base no processo sobre o esquema de desvio de verba pública que teria originado a fortuna do falecido general.

Eu estava pensando no Brasil, no Rio de Janeiro, na UFF e em todas as eleições que ocorrerão esse ano. Não sei por que esse texto me chamou a atenção e voltou à minha cabeça. Como quase sempre, sigo o impulso e coloco o assunto na frente de outros que provavelmente seriam mais atuais e interessantes para um eventual leitor. Aí vai:

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PINOCHET (texto de outubro de 2007)

Colegas,

Talvez esse assunto esteja longe dos temas de discussão prioritários de quase todos vocês, mas creio ser importante refletirmos um pouco sobre ele.

Na última quinta feira, dia 4 de outubro, li nos jornais que diversos membros da família Pinochet haviam sido presos com base no processo sobre o esquema de desvio de verba pública que teria originado a fortuna do falecido general – cerca de 27 milhões de dólares mantidos comprovadamente em contas no exterior.

Não alivia toda a dor e sofrimento causados pela ditadura chilena, mas, confesso, fiquei contente. Provavelmente todos serão soltos hoje e continuarão na sua linha de defesa na qual dizem que o dinheiro hoje no exterior não é fruto de corrupção – e sim de “doações, economias e rendimentos”.

Inacreditável América Latina, que já exorcizou os fantasmas das ditaduras militares e da tortura como instrumento de estado, mas na qual foram necessários quase 40 anos após o golpe militar de 1973 no Chile para que se pudesse falar publicamente: Augusto Pinochet. Ditador, assassino – e CORRUPTO.

Saudações acadêmicas

Heraldo.

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Como nos letreiros daqueles filmes que, ao final, explicam o destino dos personagens, informo que:

- Os membros da família Pinochet ficaram presos menos de 24 horas, creio.
- O Promotor do caso sofreu severas perseguições após essa prisão temporária dos Pinochet.

Contudo, ainda acredito que a America Latina conseguirá tratar a questão da corrupção endêmica na vida publica como tratou, e vem tratando, a questão das ditaduras militares e do uso da tortura como instrumento de estado.

Corrupção não pode ser tratada como coisa “natural” na política e na vida. No entanto, apesar de muitos repudiarem os políticos (e, como conseqüência, a política), principalmente pelas suspeitas de que uma boa parte deles não teria compromisso com a Ética Pública, eles votam em boa parte exatamente nesses corruptos. Ignoram solenemente dinheiro acumulado de forma suspeita fingindo pragmaticamente acreditar na explicação de que ele seria fruto “doações, economias e rendimentos”.

Numa América Latina onde as grandes fraudes eleitorais e manipulações de massas praticamente se acabaram, isso nos leva a refletir. O que explicaria esse movimento esquizofrênico de repudiar veementemente a corrupção e a falta de ética, mas votar e eleger um grande número de políticos sabidamente incompetentes, corruptos e pouco comprometidos com a democracia, ou, no mínimo, com um passado para lá de duvidoso?

Todos clamam por mudança na política, mas há os que esperam que essas mudanças venham “dos outros”, porque a lama toda em sua volta não seria absolutamente responsabilidade sua - cidadão honesto que só conhece gente bacana. Comportam-se de forma extraordinariamente semelhante a alguns prefeitos que alegaram jamais poder ser responsabilizados pelos recentes deslizamentos de terra causados pelas chuvas, pois a lama seria culpa de “outros” – de seus antecessores, de auxiliares e cientistas que não o alertaram, e de São Pedro, naturalmente.

As verdadeiras mudanças sociais quase sempre coincidem com mudanças de mentalidades e, conseqüentemente, do comportamento de cada indivíduo. Jogar a culpa da corrupção e falta de ética na política “nos outros” é fácil. Esperar que as soluções venham “dos outros” também é fácil. Eximir-se de responsabilidades é mais fácil ainda. Difícil é sair da pasmaceira e da acomodação convenientes, e correr riscos. Trombar com alguns supostos “poderosos”. Viver é correr riscos. Eventualmente tudo pode “continuar como está”. Eventualmente, tudo pode mudar, de repente, quase sempre aos saltos.

E se algum cidadão vota num corrupto supostamente por falta de alternativas para assegurar a execução de obras públicas relevantes, ou porque suas perdas (do ponto de vista material, profissional, etc.) seriam muito grandes com a queda desse dirigente político, é bom refletir. Provavelmente já se tornou também, conscientemente ou não, um corrupto.

Se as críticas à incompetência, à corrupção e ao descalabro ético na política feitas pela maioria das pessoas forem sinceras, basta excluir, no voto, em todas as instâncias possíveis, os indivíduos que são a óbvia negação de todas as nossas expectativas de uma sociedade menos injusta e desequilibrada.

Saudações Acadêmicas,
Heraldo

sábado, 17 de abril de 2010

MICARETA

Oi pessoal,

Cenas como as que foram mostradas pela TV há algum tempo - políticos flagrados sorridentemente abraçados a pacotes de dinheiro, no chamado “Escândalo do Panetone” - acabam desanimando ainda mais os descrentes na Política (com P maiúsculo) como forma de mudar (e melhorar) a sociedade.

Peço, contudo, que pensem – esse fato não foi corriqueiro. Não se vê todos os dias corruptos flagrados e denunciados através dos principais telejornais (apesar de todo mundo ter uma vaga noção de que essas coisas acontecem no país desde Pedro Alvares Cabral).

Só em Brasília (cujo cinqüentenário praticamente coincide com o da UFF), 3 senadores e um governador tiveram os seus mandatos cassados ou tiveram que renunciar para não tê-los cassados nos últimos anos.

Alguma coisa está mudando.

Até a “grande imprensa” já percebeu há muito tempo que o nível de informação (e, portanto, o de cobrança) das pessoas aumentou. Quem não der atenção a isso, perderá público. A quase totalidade da população “está de olho”, atenta, e quer mais detalhes sobre o que é feito com os impostos pagos pelos cidadãos. Pragmatismo e politização. Nada de se satisfazer apenas com discursos de protesto, mas a exigência de mudança e de resultados visíveis na qualidade de vida. Queremos mais e queremos já.

A campanha morna para reitor da UFF indicaria desinteresse e conformismo, ou que mudaram os tempos com o surgimento de novas práticas políticas? Eu acho que muita coisa mudou e que desse eloqüente silêncio da maioria emergirá, através do voto, posições bastantes claras exigindo ética e mudanças.

Apesar de um aparente marasmo, sob a superfície calma do cotidiano acadêmico há uma movimentação de pessoas insatisfeitas buscando construir uma Universidade ainda melhor - com Excelência Acadêmica e Democracia. Mobilização um tanto espontânea e com mais intuição do que certezas, como iniciam quase todos os processos políticos de massas. Nesse processo de busca de mudança acadêmica com democracia, os envolvidos errarão (erraremos) muito ainda, mas sem perder o ânimo e o senso de humor. Tentaremos.

Para os desanimados, que, equivocadamente, na calma vêem desânimo e acomodação - e com isso perspectiva de continuidade - recomendo que façam uma rápida leitura da letra de Chico Buarque, a seguir. De repente, podemos ter um carnaval fora de hora, uma imensa Micareta Acadêmica. O “samba no pé” de cada um aparecerá naturalmente no momento certo, não tenho dúvidas quanto a isso.

Saudações Acadêmicas,
Heraldo


“Quem me vê sempre parado, distante garante que eu não sei sambar
Tô me guardando pra quando o carnaval chegar
Eu tô só vendo, sabendo, sentindo, escutando e não posso falar
Tô me guardando pra quando o carnaval chegar...

E quem me ofende, humilhando, pisando, pensando que eu vou aturar
Tô me guardando pra quando o carnaval chegar
E quem me vê apanhando da vida duvida que eu vá revidar
Tô me guardando pra quando o carnaval chegar...”

Quando o Carnaval Chegar – Chico Buarque de Holanda

segunda-feira, 12 de abril de 2010

ELEIÇÕES PARA REITOR E REFORMA DO ESTATUTO DA UFF – MISTIFICAÇÃO OU OPORTUNIDADE?

Oi Pessoal,

A UFF fará em setembro um plebiscito sobre: (i) gratuidade de ensino nos cursos de pós-graduação lato sensu (autofinanciáveis); (ii) criação de uma Ouvidoria; (iii) criação de Conselho Superior Único - atualmente são três conselhos: Universitário (CUV); de Ensino e Pesquisa (CEP); e de Curadores (CUR).

Embora a discussão se embaralhe com a consulta para Reitor, que ocorrerá nos dias 18, 19 e 20 de maio, ela pode ser uma oportunidade bastante interessante para ouvir o que pensam os candidatos, antes que a comunidade universitária possa se manifestar. Pode ser apenas uma manobra para esvaziar os processos em curso, mas pode ser um momento privilegiado para a troca de idéias com algum resultado prático no final.

Como não acredito que ninguém consiga controlar a História, decidi correr o risco de ser usado como “massa de manobra” dos “espertos” de plantão que acreditam planejar o futuro nos seus mínimos detalhes. Portanto, deixo aqui a minha contribuição preliminar para essa discussão. Na abordagem, inverto a ordem das questões, mas apresento claramente a minha opinião:

I) CRIAÇÃO DE CONSELHO SUPERIOR ÚNICO - Sou favorável a uma instância legislativa única (conselho unicameral), que se reuniria semanalmente. Não vou entrar, por enquanto, em detalhes sobre composição, câmaras técnicas, etc. Observo, contudo, que esse ”conselho único” só teria sentido se:

1) Não houvesse vagas cativas (conselheiros “biônicos” – Reitor, Vice-reitor, Diretores de Unidades ou Pró-reitores). Ninguém que excerça funções excecutivas estaria automáticamente proibido de participar, mas, por serem funções diferentes, todos os interessados deveriam se submeter a um processo eleitoral separado e diferente para cada função;

2) Os mandatos seriam de dois anos, permitida recondução;

3) A função de conselheiro não seria remunerada;

4) O Presidente e Vice-Presidente do Conselho seriam eleitos dentre os seus membros na primeira seção de cada ano legislativo (não seriam mais necessáriamente o Reitor e o Vice-Reitor da Universidade);

5) A representação do corpo discente será eleita e não mais simplesmente indicada pela Diretoria do DCE.


II - CRIAÇÃO DE OUVIDORIA – Sou inteiramente favorável à criação de uma Ouvidoria. Não vou fazer um texto enorme sobre a História das Ouvidorias e o papel do Ouvidor ou Ombudsman, o que pode ser facilmente encontrado até mesmo através da internet. A Ouvidoria, grosso modo, atuaria como um canal de comunicação entre as instâncias organizadas formalmente na UFF (Conselhos, Pró-Reitorias, etc.) e a comunidade universitária (e a sociedade em geral), buscando estabelecer um elo entre o indivíduo e a instituição, tornando esse indivíduo mais ciente de seus direitos e deveres, partícipe e colaborador na busca constante de melhorias.

1) O Ouvidor seria eleito para um mandato de dois anos, renovável, no máximo, por mais dois anos. Ele não poderia ocupar nenhum cargo executivo ou legislativo na universidade e nem ocupar cargos em sindicatos e entidades de representação estudantil durante esse período. A eleição teria a participação de todos os segmentos da Universidade;

2) O Ouvidor eleito ocuparia automaticamente a função de Presidente da Comissão de Ética Pública da UFF, constituída pela portaria n° 34.775/2006, a qual tem por função divulgar o "Código de Ética Profissional do Servidor Público Civil do Poder Executivo Federal" a todos os servidores da universidade, bem como o "Código de Conduta da Alta Administração Federal". A Ouvidoria seria encarregada por elaborar e/ou atualizar o Código de Ética da UFF, zelando por sua aplicação. Nesse código, necessariamente, deveria ser claramente explicitado o papel do Conselho Superior na análise de situações ligadas à ética pública, como o assedio moral no trabalho, por exemplo;

3) O Ouvidor não seria remunerado por suas funções;

4) A Ouvidoria teria uma página específica com um link visível e de fácil acesso na página inicial do sítio da UFF. Ela se responsabilizaria por divulgar um boletim mensal informando à comunidade, de forma resumida, as reclamações e sugestões recebidas nesse período. Nesse Boletim seriam manifestadas as opiniões e explicadas as atividades desenvolvidas em função dos contatos recebidos (providências, encaminhamento para conselhos, orientções, etc.);

5) O Ouvidor teria direito à voz em todos os Conselhos e instâncias colegiadas da UFF, bastando comunicar o interesse em participar numa determinada reunião com um dia útil de antecedência.

III - GRATUIDADE DE ENSINO NOS CURSOS DE PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU (AUTOFINANCIÁVEIS). A Princípio eu não seria contrário a que pudessem existir alguns cursos pagos na universidade, desde que o atual Regimento Interno da UFF para esse tipo de atividade fosse substancialmente alterado, incluindo limites adequados e mecanismos para acompanhamento e controle, não apenas da parte financeira, mas, principalmente, da sua qualidade acadêmica. Há um anteprojeto visando aperfeiçoar o regimento interno dos cursos lato sensu da UFF tramitando há anos no CEP. Misteriosamente, aparentemente, empacou (ou desapareceu) nos labirintos da burocracia da Secretaria dos Conselhos. Embora eu ache que qualquer tipo de proibição absoluta a cursos autofinanciáveis seja basicamente uma burrice, se for obrigado a escolher entre a atual situação de vácuo legislativo e a proibição, votarei favoravelmente à proibição. Até há uns dois anos atrás não tínhamos nem mesmo a lista dos alunos inscritos nesses cursos. Portanto, não havia controle algum (nem acadêmico e nem financeiro, pois como fazer uma contabilidade adequada sem saber quantos são, de fato, os inscritos?). Fui informado de situações inacreditáveis, como as de pessoas sem graduação inscritas em cursos pagos de pós-graduação. Contudo, acho isso tão forte que me recuso a acreditar. Também, aparentemente, houve alguns casos de “aluguel” da marca UFF (e, obviamente do certificado emitido por essa universidade pública) para cursos que não tinham nenhum dos professores da universidade efetivamente envolvidos em atividades de ensino e que se situavam nos mais diversos estados da federação (não, não eram os tradicionais cursos MINTER e DINTER da CAPES). Houve casos de cursos amplamente divulgados com o nome da UFF, realizados, mas que não foram aprovados em nenhuma instância da universidade (Departamento, Unidade, Conselhos). A universidade só veio tomar conhecimento oficialmente desses cursos quando os alunos (vítimas, nesse caso) procuraram obter o seu certificado de conclusão. Descobriram, então, que, simplesmente, haviam sido ludibriados, buscando na justiça algum tipo de reparação. Conta a lenda urbana que “pediram a cabeça” de um Pró-Reitor (e conseguiram) exatamente por ele ter tentado minimizar esse tipo de descalabro. Na dúvida, prefiro ser tachado de burro do que de conivente com desvios semilegais de dinheiro público.

Saudações Acadêmicas
Heraldo

quinta-feira, 8 de abril de 2010

MINIMUM MINIMORUM

Oi Pessoal,

Estamos em plena vigência do processo eleitoral para Reitor da UFF – uma espécie de temporada legalizada de caça ao voto dentro da comunidade universitária. Para haver composições eleitorais legítimas, numa universidade tão complexa e plural como a UFF (ainda bem!), certamente muitos terão que ceder em algumas questões que julgam importantes. Contudo, isso jamais pode significar abrir mão de princípios e conceitos que se julgam essenciais.

E O QUE É ESSENCIAL?

Fosse eu o dono da Verdade, vendela-ia a quilo (ou a metro, sei lá), ficando rico e famoso. Pobre de mim, que não chego nem perto desse sucesso filosófico-existencial-comercial. Contudo, cabeçudo, sempre considerei as minhas convicções como verdades, pelo menos até alguém conseguir me convencer do contrário.

No caso da UFF, a universidade praticamente avança em modo automático, graças aos seus grupos de pesquisadores, programas, departamentos, etc. Basta o Reitor não atrapalhar muito. A burocracia excessiva, como o DETRAN há alguns anos atrás, só é boa para os que querem criar dificuldades para vender facilidades mais adiante. Contudo, do ponto de vista da Administração Central, há alguns erros imperdoáveis sendo cometidos e cuja correção seria piso mínimo para qualquer projeto de futuro ou apoio que eu pudesse dar a algum candidato. Aí vai:

1 – UMA POLÍTICA ORÇAMENTÁRIA DEMOCRÁTICA. Por um triz chegamos a um compromisso entre democracia e eficiência no planejamento orçamentário da UFF. O chamado “PDI” da UFF se tornou muito maior do que qualquer política burocrática de governo. Tratava-se (trata-se?) de um conjunto de programas estruturantes discutidos com a comunidade visando: (i) um melhor planejamento orçamentário anual, no caso de investimentos; (ii) desenvolvimento de mecanismos democráticos para acompanhamento e controle não somente dos investimentos, mas também das verbas de custeio, principalmente dos grandes contratos (energia, segurança e vigilância, limpeza, manutenção de elevadores, etc.). Isso permitiria controlar desperdícios, evitando “gargalos” orçamentários, de forma que houvesse, de fato, recursos para investimentos dentro do orçamento disponível (redução nos gastos de custeio com maior qualidade nos gastos para investimentos).

Perdemos quase que completamente o bonde da história nesse caso, numa administração desastrada que ficou embasbacada com os recursos temporários do REUNI, sem ter a menor noção de controle orçamentário ou visão de médio e longo prazo. Abandonamos quase todos os bons mecanismos de execução orçamentária e de planejamento, tão duramente conquistados ao longo de anos em diferentes administrações da UFF. O ponto de partida para qualquer administração futura com alguma prevenção de eficiência seria recuperar essa história de sucesso tão rica e jogada praticamente no lixo.

2 – UMA POLÍTICA TRANSPARENTE PARA ALOCAÇÃO DE VAGAS E CONTRATAÇÕES. Há muitos anos atrás, a alocação de vagas distribuídas pelo MEC para a UFF era fruto de um acordo feito entre o Reitor e os Diretores de Centro. Fortemente criticado pela maioria da comunidade (e eu fazia parte dos que criticavam), esse critério era apontado como pouco democrático, possibilitando alguns equívocos e manipulações. Por outro lado, como ponto positivo, estava a efetiva agilidade do processo (só o Reitor e os 4 diretores de Centro estavam diretamente envolvidos) e o fato de envolver alguns dos principais protagonistas do processo político da universidade.

Há alguns anos, o Conselho de Ensino e Pesquisa da UFF (CEP) buscou criar uma legislação mais democrática (Resolução 46/2005), baseada nos indicadores dos Departamentos de Ensino, e focada nesses Departamentos. Como todo processo político, sempre teve um viés de favorecer áreas com maior peso na Universidade (peso político e não necessariamente acadêmico), mas significou um enorme avanço nos mecanismos de decisão da UFF, tornando-os um pouco mais impessoais. Como Conselheiro do CEP e membro da Comissão de Redação do anteprojeto, tive a honra de participar desse rico processo de discussão, muitas vezes em posição minoritária, mas reconhecendo que a legislação resultante era muito mais democrática e refletia claramente o que éramos como instituição.

Para minha surpresa, no caso da alocação de vagas do REUNi, não valeu a legislação vigente e o CEP foi excluído da discussão do processo de expansão da UFF. As vagas foram distribuídas usando-se um estranho critério por Unidades, independente do número de Departamentos (e cursos) de cada uma delas. Minha conclusão é que ficamos no pior dos mundos – foi usado um “critério” pouco democrático e que não respeitou os Departamentos e nem a legislação vigente. O grupo formado pelos Diretores de Unidade (dezenas de Diretores), embora importantíssimo e representativo, por sua natureza política e tamanho, não é ágil e adequado para decisões técnicas rápidas. Portanto, ficou pior do que no tempo dos Diretores de Centro. Andamos para trás.

Não há futuro para quem não olha o seu passado e nem respeita o seu presente. Cursos com dezenas de anos de tradição, bem avaliados pelo MEC, foram deixados de lado, pois sua expansão seria limitada. De fato, um curso como o de Medicina (exemplo aleatório, mas bastante representativo) não pode duplicar o seu número de alunos sem comprometer a sua qualidade. Aliás, seria um ato de irresponsabilidade dos seus Dirigentes. Por outro lado, é fácil expandir um curso numa área nova num local longínquo e com pouca infra-estrutura. Em tempo – a estatística pode ser enganosa e ser usada para iludir os menos informados – um curso com 4 alunos formados por ano pode facilmente passar a formar 8, isso significaria um aumento de 100% na sua taxa de sucesso!

Para que possamos ter um processo de expansão ordenado, temos que estabelecer critérios mais claros para a alocação de vagas, entre outras coisas. A qualidade do que vai ser oferecido é um ponto fundamental. Essa discussão, estatutariamente, queiram ou não, passa pelo CEP.

Finalmente, o “BANCO DE VAGAS” da UFF, não pode ser um instrumento de controle, pressão e manipulação, seja do Reitor ou de algum seu preposto, como um pró-Reitor para Assuntos Acadêmicos. O BANCO DE VAGAS DEVE SER PÚBLICO, acessível através do a página da UFF, e públicas devem ser as regras para a utilização (ou de trocas entre Departamentos de Ensino) da vagas nele disponíveis.

3- CONSULTAS DIRETAS PARA DIREÇÕES EM TODOS OS NÍVEIS. Apesar de falhas no sistema para escolha de Dirigentes nas universidades públicas, ainda não inventaram nada melhor do que a consulta direta para aferir os desejos de uma comunidade. A alternativa, defendida por alguns, seria um sistema de busca feito por comitês externos, com regras claras e mandato para o escolhido. Contudo, a indicação para Direções de Unidades e de Pólos segue regras análogas às para a escolha de Reitor e são regidas por lei. A Lei no 9.192, de 21 de dezembro de 1995, o Decreto no 1.916 da Presidência da República, de 23 de maio de 1996 e o Decreto nº 6.264, de 22 de novembro de 2007, regulamentam o processo de escolha dos dirigentes de instituições federais de ensino superior. O que temos, no momento, é um simulacro legislativo, sob indefensável argumento da fragilidade dos pólos, dada a sua juventude. O CUV vem concedendo ao Reitor o direito quase absoluto de nomear e remover Diretores sem comitês externos de busca, sem lista tríplice, sem mandato, sem a necessidade de justificativa pública e sem mecanismos coletivos de controle, acompanhamento e consulta. Creio que é o pior dos mundos. Pode estar em desacordo com a legislação federal.

Nesse processo, fragilizamos o bem mais precioso de uma universidade pública – a Democracia Universitária. Tenho certeza de que esse sistema quase absolutista de nomeação é e continuará sendo uma fonte permanente de tensões e crises na universidade.

É óbvio que, na busca por um maior controle administrativo e estabilidade política, é tentador para um Reitor manter esse poder quase absoluto. Contudo, vale para a universidade o que vale para a sociedade – essas tentações de poder absoluto, compreensíveis, devem ser imediatamente anuladas. É inacreditável que, nessa altura da história do país, as universidades públicas fiquem aquém do resto da sociedade em termos garantias democráticas e representação.

A ilusão de que um Marquês de Pombal do século 21 seria a solução para a gestão de uma universidade pública (incluindo aí, seus Pólos e suas Unidades) é perigosa. Ninguém é perfeito e ninguém é imune às tentações do poder. Por isso mesmo, o sistema legal ideal dentro da Universidade deve impedir que qualquer dirigente sequer seja tentado e/ou testado.

Eu acredito na possibilidade democrática de compartilhamento de poder. É absolutamente viável um sistema de gestão mais moderno, eficiente e transparente. Sistema criado pela necessidade e não pelo fato dos envolvidos serem seres humanos melhores ou mais iluminados. Minha preocupação, no caso dessas indicações sem participação coletiva, é com a possibilidade de se criar um ambiente de descrédito e frustração na Política como instrumento de organizar/modificar a nossa vida acadêmica.

4 - DEMOCRACIA E QUALIDADE. Um dos maiores desafios da UFF é buscar a desejada qualidade de seus cursos e pesquisas sem abrir mão da imprescindível Democracia Universitária. Não é um caminho fácil, mas também não é impossível: Não há a menor possibilidade de se construir uma universidade excelente do ponto de vista acadêmico se todos os processos internos, acadêmicos ou não, forem decididos de forma autoritária e centralizada. Também não se justifica uma universidade aberta, democrática, mas despreocupada com a formação acadêmica, com a criação de disseminação do conhecimento e com a qualidade.
5 – POR UM PODER LEGISLATIVO INDEPENDENTE NA UFF. Finalmente, esse é o meu “bode na sala”, dento desse texto. Questão que eu considero importantíssima, que independe do Reitor (provavelmente seria assunto para um novo Estatuto), e que sei ser ainda pouco aceita (e/ou entendida) por muito dos colegas que julgo parceiros nesse momento. Certamente, não despertará muitas adesões ou entusiasmo num primeiro momento. Contudo, vale a provocação.

Em qualquer lugar do mundo democrático civilizado busca-se a independência dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário. Os Governadores não são Deputados natos (ou biônicos, como queiram) e nem os e Ministros são automaticamente senadores. Isso acontece por razões bastante práticas – eliminar focos de crises – pois o ritmo e as agendas dos diferentes poderes é muito diferente. Além disso, seria muito difícil desempenhar com eficiência tarefas que exigem muito esforço e dedicação em dois poderes diferentes.

No caso da UFF, os Diretores de Unidade são conselheiros natos no CUV e os Pró-Reitores, conselheiros natos do CEP. Foco de constantes crises, em função do embaralhamento de funções, em minha opinião. Independente de quem esteja desempenhando a função, as agendas dos Diretores de Unidade e Pró-Reitores são voltadas para os problemas executivos mais imediatos. É extremamente difícil pensar legislações futuras com demandas e pressões para solução de questões urgentes (e importantes). Além disso, como uma questão de preservação e fortalecimento de espaço político, pode se tornar tentador – vejam bem o tempo do verbo, não estou afirmando que isso acontece - evitar regulamentar muito as atividades acadêmicas, resolvendo caso a caso (e ano a ano) as questões acadêmicas recorrentes no âmbito dos Conselhos Superiores (vagas, taxas, etc). Tudo se resolveria num grande “balcão”. “Balcão” do bem, para alguns (em geral, ele é considerado “do bem” quando o indivíduo tem maioria para impor as suas visões de mundo), mas sempre “balcão”.

Outra conseqüência disso é a falsa convicção de que o CUV é um órgão “político” e o CEP um órgão “eminentemente técnico”. Separar a boa técnica legislativa do poder político é uma rematada tolice, ou uma grosseira mistificação. O exemplo mais claro disso é a importância da Câmara de Legislação e Normas do CUV (órgão mais “técnico” e o que desperta as maiores disputas). Acreditar que um CEP independente não teria força política é até engraçado (peço aos que não conhecem, que leiam as atribuições estatutárias do Conselho de Ensino e Pesquisa).

Não estou propondo excluir os Diretores e Pró-Reitores do processo, muito ao contrário, mas eles deveriam passar pelo crivo das urnas para acumular essas funções. Como são, de fato, representativos, não teriam nenhuma dificuldade em se eleger. Mas só seria eleito quem tivesse um mínimo de vontade e disposição para o exercício legislativo.

Saudações acadêmicas,
Heraldo

Pouso noturno

segunda-feira, 5 de abril de 2010

DESFAZER ILUSÕES NÃO É DESENCANTO

A realidade
Sempre é mais ou menos
Do que nós queremos.
Só nós somos sempre
Iguais a nós-próprios.

Ricardo Reis (João Pessoa), 1-7-1916

Pessoal,

Sempre acompanhei de perto os processos políticos dentro da UFF. Vício incontrolável que eu tenho, sempre me manifestando publicamente em todas as vezes que tive alguma chance.

Como todo mundo já sabe, novamente teremos consultas para Reitor na UFF, aparentemente de 18 a 20 de maio, caso nenhuma novidade aconteça. Certamente não vou ficar calado.

I - DESFAZER ILUSÕES NÃO É DESENCANTO

Temos vários especialistas em eleições universitárias na UFF – o que certamente NÃO é o meu caso. Portanto, me absterei de fazer comentários e análises sobre possibilidades, pesos, números e outras gracinhas sobre a alquimia eleitoral. O curioso é que muitos desses especialistas são inacreditavelmente competentes para eleger pessoas, mas, em compensação, aparentam ter um vazio completo na cabeça quando se trata de discutir políticas administrativas/acadêmicas para a UFF e o Brasil.

Como professor há tantos anos, já convivi com a falta de vocação, de talento e até de competência de alguns indivíduos, quase sempre fruto de uma escolha profissional equivocada. Apesar disso, há sempre os que, quando querem, superam suas limitações através do trabalho árduo e do estudo. Infelizmente há os casos perdidos. Encontrei pouquíssimos desses casos perdidos na minha vida de docente. Em compensação, na política (e não só na política universitária), tive o desprazer de conviver com uma percentagem enorme de energúmenos sem salvação possível.

Já apoiei pessoas que se comportaram de forma adequada durante processos eleitorais e, posteriormente, como energúmenos absolutos ao longo de seu mandato. A boçalidade total só é menos imperdoável do que a falta de cuidado/respeito com a coisa pública.

Como qualquer pessoa normal, me equivoquei nas minhas boas expectativas em relação a alguns representantes políticos no passado. Esperava muito de alguns e me decepcionaram. Bons candidatos, péssimos administradores. Coisas da vida. Contudo, a despeito eventuais falhas minhas na análise de pessoas, no essencial, continuo acreditando no que escrevi. Aliás, há muitos anos li em algum lugar, num contexto um pouco diferente, a seguinte frase: “desfazer ilusões não é desencanto – é aprumar a voz para cantar ainda mais forte”. Vamos cantar forte, então.

Encaminho a seguir um texto escrito por mim já há muito tempo. É uma reflexão sobre as bases para se compor, de forma ética e democrática, uma maioria para a gestão eficiente da universidade. Continua atual, creio.


II - VIVA A UNIVERSIDADE VIVA


A sociedade está mudando muito mais rápido do que a Universidade Pública no Brasil. Isso não me parece algo antinatural numa sociedade moderna. Tradicionalmente careta e conservadora, a Universidade, tal qual foi concebida há séculos, sempre teve dificuldade de acompanhar as transformações sociais. O surpreendente, contudo, é constatar a forma rápida como a Universidade Pública brasileira está perdendo “o bonde da história” nesse processo de acompanhamento das transformações da sociedade brasileira.

As Universidades Públicas, que foram vanguarda no processo de consolidação democrática no país, apresentam, aparentemente, ainda, certas características da política de clientela que morreu há décadas na maioria das grandes cidades e que só sobrevive nos grotões. Vemos pressões, ações que pode ser confundidas com intimidação e/ou perseguições, um concreto receio das pessoas de se manifestar publicamente e um “senso comum” de que “as coisas são assim mesmo” e “é ingenuidade acreditar que possa ser diferente”.

É um discurso antiquado, que caminha na contramão do que se passa no país, que está mudando rapidamente e consolidando cada vez mais as instituições públicas democráticas.

Com o aumento do orçamento para investimento nas IFES (incluindo aí a UFF), é necessário abandonar os antigos paradigmas de gestão, típico de empresas familiares, na qual um “pai patrão” distribui mesadas aos filhos obedientes e pune os rebeldes, criando mecanismos mais eficientes e transparentes de tratar os recursos públicos.

Uma gestão amadora, baseada em vínculos pessoais, pode ser ter sido uma boa opção quando o orçamento e complexidade da UFF e das unidades eram pequenos. Como numa empresa com gestão familiar que cresceu, para evoluir além de um certo ponto, torna-se necessário romper velhos paradigmas e optar por mecanismos mais eficazes e profissionais de gestão. Nesse caso, a transparência não é resultante de uma maior grandeza pessoal dos gestores, mas sim uma exigência para se obter resultados melhores com o mesmo volume de recursos.

Prestações de conta sistemáticas ao final de cada ano, junto com uma estimativa pública do orçamento disponível para o ano seguinte, são fundamentais para se estabelecer prioridades, definir programas estruturantes e se fazer escolhas, uma vez que as necessidades ainda são muito maiores do que os recursos disponíveis. A definição de indicadores que permitam aferir periodicamente a eficácia das políticas implementadas também é essencial.

Ao contrário do que pensam alguns colegas, o principal dilema hoje nas universidades federais não é a possibilidade de apropriação pública de recursos de origem privada, o que, segundo alguns, poderia “quebrar” toda a lógica de gratuidade do sistema. Para mim o grande desafio ainda é o estabelecimento de mecanismos que impossibilitem, nas universidades, a apropriação privada de recursos e bens públicos.

O bom sistema é aquele que não dá chance ao gestor de ter a sua probidade testada. Quando indivíduos, e não instâncias colegiadas, podem decidir sobre taxas, sobre renunciar ou não a receitas, sobre a distribuição das oportunidades, surgem as seguintes questões: Quando esse tipo de atitude pode caracterizar um conflito de interesses? Quando esse tipo de atitude pode caracterizar o uso de cargo público para obter vantagens para si ou para terceiros? Qual o limite da ética, a fronteira?

Apesar de a UFF estar passando por um processo de afirmação e modernização que é irreversível, este processo poderia (e ainda pode) ser mais dinâmico, dependendo das capacidades de gestão. Sem amplas maiorias, há, grosseiramente falando, duas alternativas para viabilizar a condução da gestão da Universidade - (i) compor uma direção pouco aberta, cuja base de apoio seria formada principalmente através de cooptações pessoais envolvendo cargos, vantagens e os mais diversos tipos de benesses pessoais, financeiras ou não; (ii) uma gestão na qual, a partir de certos princípios mínimos, a gestão seria compartilhada, gerando uma maioria que viabilizaria a governabilidade.

Não faço juízo moral das pessoas e não vejo a disputa política como uma luta do bem conta o mal. Estou convencido, contudo, de que a primeira alternativa para viabilizar a gestão da UFF (e de suas Unidades), mencionada no parágrafo anterior, objetivamente induz a um comportamento menos ético dos dirigentes.

Um “rachuncho” coletivo de cargos e funções, tradicional forma de se iniciar diálogos para a formação de alianças, mesmo antes de se ter diretrizes políticas mínimas para o médio e longo prazo é um tiro no escuro e a certeza de uma (mais uma) crise anunciada para o futuro.

Para que a segunda alternativa dê certo, contudo, é fundamental a existência de um projeto de futuro comum para a universidade, pois como diz o ditado – não há vento favorável para quem não sabe para onde se dirige. Além disso, é fundamental a maturidade política dos envolvidos, visão de longo prazo e alguma percepção dos processos políticos em andamento. Os caminhos para atingir alguns objetivos comuns de longo prazo podem ser os mais variados possíveis. Isso não seria um problema, pois é aí que entram a discussão e a disputa política legítimas.

Sem nenhuma ingenuidade e sem buscar nutrir falsas expectativas de mudanças extraordinárias, acredito que podemos quebrar velhos paradigmas e criar as bases de um sistema de gestão mais moderno, eficiente e transparente. Sistema criado pela necessidade e não pelo fato dos envolvidos serem seres humanos melhores ou mais iluminados. Manifestei essa minha opinião na última consulta para reitor. Continuo acreditando nisso.

Surpreendentemente, muitos colegas têm receio de se manifestar publicamente. Alguns, por medo de perderem supostas “vantagens” (investimento em laboratórios, prédios, etc.) caso desafiem em voz alta o poderoso de plantão. Tenho certeza de que, apesar do evidente jogo de pressões que existe em todos os processos políticos, esse receio é muito mais produto de uma “cultura do medo” já enraizada do que fruto de atos concretos de quem quer que seja. Contudo, uma universidade que se cala é uma universidade morta. Não lutamos tanto para consolidar a normalidade democrática no país para, no limite, abaixar a cabeça para supostos donos de pequenos poderes dentro da Universidade.

Todos nós queremos a universidade viva. Portanto, é fundamental dar voz àqueles que acreditam ser necessário buscar alternativas e fazer mudanças, muitos dos quais andam muito desiludidos ou ainda têm medo de se manifestar publicamente.

Um novo tempo exige novas atitudes. EXIGE, PRINCIPALMENTE, PARTICIPAÇÃO ATIVA DE TODOS E COBRANÇA.

Despeço-me dos colegas tornando público um dos meus desejos para o ano do cinqüentenário da UFF: maturidade a todos os protagonistas políticos e a unidade dos que acreditam ser necessário buscar alternativas e fazer mudanças, sempre respeitando a democracia universitária na permanente busca da qualidade acadêmica.

Saudações universitárias
Heraldo

PS: Aviso aos navegantes - Posso ser chato, mas não sou candidato a nada.